sábado, 5 de março de 2011

A Fuga


Sonho.
No fundo ela sabia que aquilo havia sido apenas sonho ou no fim das contas ficou por parecer.
Muita realidade, desencaixada e distorcida, um tempo depois parece mesmo não ter existido a não ser pela poeira alta que fica por onde passaram aqueles pés tortos.
Sonho, que fique por sonho, ela pensava.
A realidade que tinha nas mãos agora era tão maior que não importava mais.
Nos últimos dias só atendia as vontades do coração, as mais improváveis e as reprováveis também.
Não demorou muito para perceber que estava certa, que tinha acertado na escolha de vez.
Depois de tantas noites tão cheias de gente que fediam a vazio, a ausência pura, a hipocrisia crua escrachada em sorrisos entorpecidos e ocos em meio aquele cheiro de suor, álcool, fumaça e lágrima omissa, em cima dos pés doidos enfiados em um salto que não elevava sua moral, sua estima, que sequer fazia notar sua presença no meio de toda aquela gente que não existia pra ninguém. Afogada naquela carência absurda se entregando àqueles vulgos lances casuais que hoje lhe pareciam nojentos. Saturada daquela ladainha de gente burra, sem visão, sem ideal, sem paixão, com tesão apenas por aquelas coisas tão simplistas, por aquelas danças escrotas, aquelas conversas bobas e opiniões superficiais. Onde estava a vida de toda aquela gente morta que ela encontrou?
Pra onde ia a sua própria vida?
Fugiu, fugiu de tudo.
Mas não sabe até que hora vai seguir sem se perguntar: - será que não estavam todos os outros certos?

6 comentários:

  1. "..no meio de toda aquela gente que não existia pra ninguém.."

    Adorei.

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  2. cheias de gente que fediam a vazio


    Impactante!!

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  3. " pés doidos enfiados em um salto que não elevava sua moral" !!! melhor que isto só o uso do verbo 'feder' .

    fix.

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