quinta-feira, 27 de maio de 2010

Não desejo que alguém se compadeça tão seco coração.
A mediocridade é digna de pena.
Tanta maldade não merece compaixão,
Mas tamanhos desfavorecidos intelectualmente
Tornam-se absurdamente inconvenientes quando
Despendem suas vidas em tentar ser o que não são,
O que não serão,
Porque Deus não os contemplou com a humildade
Só vazio absoluto.
Por tal mortal não se cria piedade
E por eles não há bandeira em meia haste simbolizando a dor do luto.
Eu, no meio do fogo cruzado da futilidade
Defendo sozinho os ideais pelos quais luto.
Continuo tendo a inteligência como aliada
E faço dela escudo pela minha felicidade.
Procurando não ser bruto com que não cala,
Aprendi que o silêncio é dádiva do conteúdo.

Ramona C. Reichert
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quarta-feira, 19 de maio de 2010

Tem dias que fica tudo tão mais vivo.
Em dias assim...
a percepção se aguça,
os sentidos explodem
e meu corpo é a própria sensibilidade.
Tudo dentro e fora de mim fica fino, frágil e delicado.
E caminho como se mais ninguém estivesse na estrada.

Em dias como esse...
Eu fujo da verdade a qualquer custo mas ela me encontra, me esmaga e me mata de susto.
E fujo da vida como quem foge do algoz, essa vida crua que me esfrega na cara todos os meus enganos.
E ainda fujo das pessoas como quem foge de uma ameaça, essas pessoas que são os meus fatais enganos.


Esses são dias de comparação...
Dias em que eu procuro obsessivamente encontrar o que me diminui e me faz submergir.
Eu procuro ...
a maior beleza,
liberdade,
inteligência,
segurança,
neurose,
o melhor carinho
corpo,
abrigo,
sorriso,
abraço.

Nesses dias....
As coisas são sempre dos outros,
nunca minhas,
e eu admiro o oponente com uma paixão violenta que vem de mim, mas que também não é minha.

São dias em que....
fico em carne viva,
exposta à vida,
expondo a ferida.

Dias em que....
eu me viro do avesso e fico toda pra dentro de mim,
eu me preciso como ninguém
e não preciso de nada além,
porque de mim eu não me defendo,
me mutilo pelo meu próprio prazer masoquista,
e não dou mais esse direito a ninguém.


Ramona C. Reichert

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Desconexo mas preciso.
Melhor não tentar entender.

terça-feira, 11 de maio de 2010



Bem vinda velha amiga!
Quanto tempo não vimos?
Seis? Sete meses?
Não quero que entre, nem que sente, mas confesso que é bom sentir a doce vertigem e a larga liberdade que tua companhia me proporciona.
Quando estás comigo eu não penso em consequências.
Quando estás longe de mim eu não sofro consequências.
Não quero que vá embora, não pense isso, tenho um suave saudosismo dos dias que passamos juntas.
Só não quero que se demore, que me mude, que tudo desmorone.
Sim, eu sei que tudo de grande que fiz foi contigo ao meu lado.
Sei que não tenho coragem, que só tenho a ti quando preciso de qualquer impulso vital mais forte do que meramente existir.
Também sei que me escondo atrás de ti.
Que te uso para cobrir minhas dores, que te destaco para ofuscar minhas fraquezas.
Eu sei de tudo.
Sei quem sou sem ti, não sei quem sou contigo e sinceramente penso que prefiro não saber quem sou, assim eu me sinto maior.
Isso também não quer dizer que eu te quero aqui!
E não te querer aqui não quer dizer que estou te expulsando de minha casa.
Você vê?
Está vendo como fico confusa quando respiro o mesmo ar que você?
É...
A insanidade voltou e eu nem sentia saudade dela! (será que não?)
A camisa de força já vem abrindo os braços, me procurando para o abraço que eu a todo custo tentei evitar
Sabe o que eu acho?
Tem coisas na vida que transformam mesmo a gente.
Que a insanidade venha... vá...
Qualquer coisa que eu fizer com ela ou sozinha não mudará nada do que me transformou.
Mais insana ou menos insana, o fato é que nunca mais serei a mesma.

Ramona C. Reichert
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Esse texto não é autobiográfico,
e se for, o que se passa não é nada assim tão dramático.

domingo, 9 de maio de 2010

Tenho muita coisa para escrever e pouco tempo para colocar as idéias no lugar.

Clarice fala por mim:

"(...) Sim, esta é a vida vista pela vida. Mas de repente esqueço como captar o que acontece, não sei captar o que existe senão vivendo aqui cada coisa que surgir e não importa o quê: estou quase livre de meus erros. Deixo o cavalo livre correr fogoso. Eu, que troto nervosa e só a realidade me delimita.
E quando o dia chega ao fim ouço os grilos e torno-me toda repleta e ininteligível. Depois vivo a madrugada azulada que vem com o seu bojo cheio de passarinhos - será que estou te dando uma idéia do que uma pessoa passa em vida? E cada coisa que me ocorra eu anoto para fixá-la. Pois quero sentir nas mãos o nervo fremente e vivaz do já e que me reaja esse nervo como buliçosa veia. E que se rebele, esse nervo de vida, e que se contorça e lateje. E que se derramem safiras, ametistas e esmeraldas no obscuro erotismo da vida plena: porque na minha escuridão enfim treme o grande topázio, palavra que tem luz própria.
Estou ouvindo agora uma música selvática, quase que apenas batuque e ritmo que vem de uma casa vizinha onde jovens drogados vivem o presente. Um instante mais de ritmo incessante, incessante, e acontece-me algo terrível.
E que passarei por causa do ritmo em seu paroxismo - passarei para o outro lado da vida. Como te dizer? É terrível e me ameaça. Sinto que não posso mais parar e me assusto. Procuro me distrair do medo. Mas há muito já parou o martelar real: estou sendo o incessante martelar em mim. Do qual tenho que me libertar. Mas não consigo: o outro lado de mim me chama. Os passos que ouço são os meus.
Como se arrancasse das profundezas da terra as nodosas raízes de árvore descomunal, é assim que te escrevo, e essas raízes como se fossem poderosos tentáculos como volumosos corpos nus de fortes mulheres envolvidas em serpentes e em carnais desejos de realização, e tudo isso é uma prece de missa negra, e um pedido rastejante de amém: porque aquilo que é ruim está desprotegido e precisa da anuência de Deus: eis a criação.
Será que passei sem sentir para o outro lado? O outro lado é uma vida latejantemente infernal. Mas há a transfiguração do meu terror: então entrego-me a uma pesada vida toda em símbolos pesados como frutas maduras. Escolho parecenças erradas mas que me arrastam pelo enovelado. Uma parte mínima de lembrança do meu bom-senso de meu passado me mantém roçando ainda o lado de cá. Ajude-me porque alguma coisa se aproxima e ri de mim. Depressa, salva-me.
Mas ninguém pode me dar a mão para eu sair: tenho que usar a grande força - e no pesadelo em arranco súbito caio enfim de bruços no lado de cá. Deixo-me ficar jogada no chão agreste, exausta, o coração ainda pula doido, respiro às golfadas. Estou à salvo? enxugo a testa molhada. Ergo-me devagar, tento dar os primeiros passos de uma convalescença fraca. Estou conseguindo me equilibrar.
Não, isto tudo não acontece em fatos reais mas sim no domínio de - de uma arte? sim, de um artifício por meio do qual surge uma realidade delicadíssima que passa a existir em mim: a transfiguração me aconteceu.Mas o outro lado, do qual escapei mal e mal, tornou-se sagrado e a ninguém conto meu segredo. Parece-me que em sonho fiz no outro lado um juramento, pacto de sangue. Ninguém saberá de nada: o que sei é tão volátil e quase inexistente que fica entre mim e eu.Sou um dos fracos? fraca que foi tomada por ritmo incessante e doido? se eu fosse sólida e forte nem ao menos teria ouvido o ritmo? Não encontro resposta: sou. É isto apenas o que me vem da vida. Mas sou o quê? a resposta é apenas: sou o quê. embora às vezes grite: não quero mais ser eu!! mas eu me grudo a mim e inextricavelmente forma-se uma tessitura de vida.
Quem me acompanha que me acompanhe: a caminhada é longa, é sofrida mas é vivida. Porque agora te falo a sério: não estou brincando com palavras. (...)"


Clarice Lispector
Trecho do Livro Água Viva, sem dúvida o meu preferido.

domingo, 2 de maio de 2010

A idéia clássica do final feliz de toda história me encanta, mas me assusta a constatação fática de que nada na vida é assim tão definitivo

...


Com licença, tenho que ir ali viver mais um feliz para sempre.


Ramona C. Reichert