domingo, 13 de setembro de 2009

"QUINTANARES"

Hoje resolvi postar alguns dos meu poemas e frases favoritas de Mário Quintana. Mestre da poesia que admiro demais.



Eis os "Quintanares":


EU ESCREVI UM POEMA TRIST E (A cor do invisível)
Eu escrevi um poema triste
E belo, apenas da sua tristeza.
Não vem de ti essa tristeza
Mas das mudanças do Tempo,
Que ora nos traz esperanças
Ora nos dá incerteza...
Nem importa, ao velho Tempo,
Que sejas fiel ou infiel...
Eu fico, junto à correnteza,
Olhando as horas tão breves...
E das cartas que me escreves
Faço barcos de papel!


POEMA (Caderno H)

Mas por que datar um poema?

Os poetas que põem datas nos seus poemas me lembram essas galinhas que carimbam os ovos...

O TRÁGICO DILEMA ( Caderno H)
Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um dos dois é burro.



XVII (A RUA DOS CATAVENTOS )
Da vez primeira em que me assassinaram,

Perdi um jeito de sorrir que eu tinha.
Depois, a cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha.
Hoje, dos meu cadáveres eu sou

O mais desnudo, o que não tem mais nada.
Arde um toco de Vela amarelada,
Como único bem que me ficou.
Vinde! Corvos, chacais, ladrões de estrada!

Pois dessa mão avaramente adunca
Não haverão de arracar a luz sagrada!
Aves da noite! Asas do horror! Voejai!

Que a luz trêmula e triste como um ai,
A luz de um morto não se apaga nunca!


DO ESTILO (Caderno H)
O estilo é uma dificuldade de expressão.



DA OBSERVAÇÃO (Espelo Mágico)
Não te irrites, por mais que te fizerem...

Estuda, a frio, o coração alheio.
Farás, assim, do mal que eles te querem,
Teu mais amável e sutil recreio...


DESTINO ATROZ (Caderno H)
Um poeta sofre três vezes: primeiro quando ele os sente, depois quando ele os escreve e, por último, quando declamam os seus versos.



INSCRIÇÃO PARA UM PORTÃO DE CEMITÉRIO (A cor do invisível)
Na mesma pedra se encontram,

Conforme o povo traduz,
Quando se nasce - uma estrela,
Quando se morre - uma cruz.
Mas quantos que aqui repousam
Hão de emendar-nos assim:

"Ponham-me a cruz no princípio...E a luz da estrela no fim!


PRESENÇA
É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,

teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento

das horas ponha um frêmito em teus cabelos...
É preciso que a tua ausência trescale

sutilmente, no ar, a trevo machucado,

as folhas de alecrim desde há muito guardadas

não se sabe por quem nalgum móvel antigo...
Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janelae respirar-te, azul e luminosa, no ar.
É preciso a saudade para eu sentir

como sinto - em mim - a presença misteriosa da vida...
Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista

que nunca te pareces com o teu retrato...
E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te.


DA INQUIETA ESPERANÇA
Bem sabes Tu, Senhor, que o bem melhor é aquele

Que não passa, talvez, de um desejo ilusório.

Nunca me dê o Céu... quero é sonhar com ele

Na inquietação feliz do Purgatório.

TROVA
Coração que bate-bate...Antes deixes de bater!

Só num relógio é que as horas
Vão passando sem sofrer.


ESPERANÇA
Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano

Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem

Atira-se
E— ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...


O AUTO-RETRATO (Apontamentos de História Sobrenatural)
No retrato que me faço- traço a traço -às vezes me pinto nuvem,

às vezes me pinto árvore...
às vezes me pinto coisasde que nem há mais lembrança...

ou coisas que não existem mas que um dia existirão...
e, desta lida, em que busco- pouco a pouco -

minha eterna semelhança,
no final, que restará?

Um desenho de criança...Corrigido por um louco!


AH! OS RELÓGIOS (A cor do Invisível)
Amigos, não consultem os relógiosquando um dia eu me for de vossas vidas
em seus fúteis problemas tão perdidas
que até parecem mais uns necrológios...
Porque o tempo é uma invenção da morte:

não o conhece a vida - a verdadeira -em que basta um momento de poesia
para nos dar a eternidade inteira.
Inteira, sim, porque essa vida eterna
somente por si mesma é dividida:
não cabe, a cada qual, uma porção.
E os Anjos entreolham-se espantados
quando alguém - ao voltar a si da vida -acaso lhes indaga que horas são...

Um comentário:

  1. Fiquei fascinado pelo que li aqui.
    O nome "Quintana" sempre esteve presente na área "conhecimentos gerais" da minha cabeça, mas nunca tinha tomado conhecimento da obra dele, propriamente dita.
    Até agora =P

    Ele escrevia como quem passa uma mensagem simples. Sem rodeios.
    Só uma definição me vem à cabeça: ele escrevia com o coração.

    Os traços da personalidade sonhadora são evidentes, e tudo tem muita doçura.

    Como eu disse: já estou quase mudando de escritor favorito.

    Mas não de escritora ;)

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