quarta-feira, 1 de setembro de 2010

É essa estranheza que me perturba.
Eu saio e volto e tudo fica do jeito que deixei.
Perturba, mas não é uma perturbação ruim, como não é boa.
Eu estou feliz, embora com uma dor contínua, mas suave, que não dá trégua, como se tivesse no meio do coração um hematoma que não me deixa esquecer que ele existe.
Na casa as roupas estão lisas, o chão limpo, os móveis lustrados, o cachorro está mais feliz e as flores mortas no vaso continuam lá para me recordar que ninguém trará novas.
Tranquilamente eu chego, atiro o peso do dia no chão e me jogo na poltrona. Pela quarta vez eu leio “A Paixão segundo G.H.” e afirmo com ela, eu também não quero o que eu vi e também já não sou nem serei mais a mesma depois do que vi e vivi. Não quero saber quem me odeia um ódio indiferente ou o quanto doeu me desfazer de uma terceira perna que me mantinha segura, embora imóvel. Eu estou sozinha na sala, na casa, na alma, ninguém faz barulho, o telefone não toca e ninguém me oferece um café, posso ler sem perturbações, sem aquelas coisas que a gente vê como perturbações quando quer se convencer de que foi melhor assim.
Percebo que estou mais sozinha do que nunca, mas em paz com a minha solidão, me sinto tão completa na minha condição de mulher que eu mesma me basto.

Ramona C. Reichert

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