quinta-feira, 1 de abril de 2010

Saí desatinado.
Não sentia conforto em lugar nenhum, já não tinha mais para onde fugir, nem lugar seguro para me esconder.
Atravessei a rua sem olhar para os lados, absorto em pensamentos que não eram meus, sobre coisas que não eram minhas...
Continuei andado com a cabeça baixa pelo peso de problemas que eu não causei, estonteado por culpas que assumi sem porquê.
Não esperava chegar em algum lugar.
Não sei como percebi ao lado de uma escada, sentada na calçada, uma menina de olhos inchados e mãos pequenas que seguravam um rosto delicado quase sem expressão.
Não senti pena, também não senti ternura. Não encontro a palavra para definir, mas senti qualquer coisa forte demais. Senti que estávamos ligados, ligados pela mesma dor, ligados porque sofríamos.
O sofrimento une os iguais.
Me aproximei e sentei ao seu lado em silêncio.
Não precisei perguntar nada, estávamos na mesma sintonia, ambos quase sem pulso.
Ouvi ela sussurrar:
- Não tem solução. Nesse mundo insano de pessoas desequilibradas ninguém conhece ninguém, ninguém tem ninguém, ninguém é alguém. Do tombo da entrega cega ao grande vácuo da indiferença eu só levo as cicatrizes, as consequências que não são minhas e o medo...
O medo que me faz ter certeza de que jamais serei a mesma. Temo a minha própria sombra, que dirá as alheias. Estou me vendo capaz de muita coisa, muito mais do que imaginaria... nem eu me conheço mais.
Não ousei responder, nem tinha moral para isso.
Eu concordava com cada palavra e entendia. Em silêncio eu entendia.
Não lembro o que aconteceu depois...
Continuo sobrepondo os dias... sem rumo certo, meio tonto, com a cabeça pesada, mas com a certeza de que não sou o único e nem por isso menos sozinho.

Ramona C. Reichert

3 comentários:

  1. O texto tem o teu tom mais melancólico de ser, e isso lhe dá uma beleza que me agrada muito.

    Como é bom saber que a dor que sentimos não sentimos sozinhos, não que isso a diminua mas nos da conforto e força para então achar um rumo certo e aliviar a cabeça. Assim entendemos que os outros também sofrem...

    Amo-te macarrona. Bju

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  2. Perfeito. Sutil e preciso. Parabéns, conseguiste arquitetar muito bem essa face da solidão.

    Adorei a última frase.

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  3. Obrigada garotos!
    Fico feliz que vocês percam seu tempo pra passar aqui e ler esse monte de "sei la o que"!

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